Ouvir-me a ser, apenas
Não sei porque escrevo hoje, não tinha nada para dizer. De resto, raramente tenho. Quando comecei a escrever estas palavras procurava apenas distrair-me do trabalho que continua a aguardar-me ali na mesa. Distraía-me a observar os gatos, cujo ócio invejo. Agora distraio-me a ver as palavras a sair da minha pena ("porque terei dito pena?"), automáticas, provavelmente desprovidas de sentido. Digo provavelmente porque me recuso conscientemente a voltar atrás para reler. ("Reler é um luxo burguês", dizia-me em tempos um amigo que já lá vai.) Bom, vou parar agora. Ouvir-me a ser, apenas.